Desafio do Prefeito | Decidindo hoje o amanhã da cidade

08/06/2017
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Tenho mergulhado cada vez mais nos temas da sustentabilidade e das mudanças climáticas e sua interface com a administração municipal. Por conta das experiências exitosas de Maringá durante nossa gestão, muitos novos prefeitos que estão tomando contato pela primeira vez com a administração pública, e num momento particularmente delicado para a classe política, têm nos buscado. Querem orientação, conselhos e ideias do que implementar em suas cidades, sabendo que devem evitar gastar seu tempo, energia e recursos inventando soluções que já foram encontradas noutras gestões municipais.

 

Nesse contexto, entre as coisas para as quais procuro chamar a atenção, está a necessidade imperiosa de analisar as tendências e desafios globais e avaliar como as decisões tomadas nesta gestão poderão impactar, positiva ou negativamente, o futuro da cidade.

 

Por exemplo, se avaliarmos as previsões de alterações climáticas devidas ao aquecimento global e lermos os relatórios do IPCC, entenderemos que os fenômenos climáticos se tornarão cada vez mais intensos e frequentes. Vamos precisar de redes de drenagem diferentes para lidarmos com essas chuvas que, em 40 minutos, derramam toda água que cairia em um mês. Os loteamentos que os atuais prefeitos aprovarão nesta gestão levam estes cálculos de vazão em consideração? E as áreas potencialmente inundáveis, como estão sendo avaliadas na revisão do Plano Diretor? Equipamentos públicos estratégicos para a cidade ou região e seus acessos (como hospitais, por exemplo) estão sendo protegidos de eventuais enchentes ou intempéries futuras, ou a população será pega de surpresa quando ocorrerem? Se estão em áreas de risco, como e onde o prefeito pode buscar recursos para adaptação ou mesmo para uma eventual relocação?

 

Outra tendência bastante conhecida de todos é o novo perfil demográfico dos brasileiros – a população tem, proporcionalmente, menos jovens e mais idosos, e a tendência é que isso se acentue. Tenho visto inúmeros prefeitos pressionados por filas de espera para vagas nas creches. Deverão, portanto, construir alguns desses equipamentos nestes quatro anos. Porém, se analisarmos as mudanças esperadas na pirâmide demográfica do IBGE para o período de vida útil destes novos prédios, veremos que vão faltar crianças e sobrar idosos demandando serviços públicos da prefeitura. Sabendo dessa tendência, temos a oportunidade de projetar as creches para permitir sua conversão num centro-dia para idosos dentro de alguns anos, por exemplo, evitando que essa se torne uma questão para prefeitos futuros. Se a atual administração faz planejamento estratégico, está facilitando a solução do problema e poupando recursos significativos dos contribuintes.

 

Os avanços tecnológicos também têm uma extraordinária capacidade de ampliar a oferta de serviços públicos, com maior rapidez e comodidade a custos muito menores, e requerendo menos servidores. Aliás, a folha de pagamento é o item de maior peso em qualquer orçamento municipal.

 

Soluções tecnológicas já existentes podem agilizar, facilitar e baratear inúmeros serviços na área de saúde, com atendimentos e diagnósticos a distância, centrais de agendamento por aplicativos, monitoramento remoto de pacientes de risco. Na educação grandes avanços já estão sendo alcançados, até aplicativos de carona adaptados para descongestionar o trânsito na entrada e saída das aulas já estão transformando a vida das cidades. E na aprovação de projetos, concessão de alvarás e atualização de cadastros imobiliários, as novidades são muitas que têm antecipado receitas e acelerado investimentos.  Meses ou anos para aprovação de projetos na prefeitura são inaceitáveis no mundo de hoje. A velocidade no mundo dos negócios precisa encontrar eco no serviço público.

 

As compras públicas sustentáveis não são apenas uma demonstração de preocupação ambiental ou de civilidade dos gestores municipais. Usar o poder de compra do município para dar escala e alavancar a competitividade de produtos e serviços sustentáveis pode ser um poderoso instrumento de transformação das cidades – e que, na verdade, só depende de decisão política do prefeito.    

 

Redes inteligentes de iluminação que melhoram a qualidade de vida e economizam dinheiro ao mesmo tempo – exemplo de conectividade que ajuda na segurança pública e na mobilidade urbana – são  ferramentas que hoje não podem ser dispensadas. Mas a realidade é que poucos prefeitos sequer têm conhecimento ou acesso as estas informações e tecnologias.

 

As cidades que estimularem, no seu território, um ecossistema de inovação e que valorizarem a economia criativa terão maiores possibilidades de enfrentar e superar as crises que sobre elas se abatem, mas no fundo não são as cidades que decidem fazer isso, e sim os gestores por meio de suas decisões políticas. De fato, temos que reconhecer que essa visão holística, da análise de competitividade territorial, do planejamento estratégico de longo prazo, olhando para o futuro, não são comuns no serviço público. Essas características são intrínsecas do setor privado e do terceiro setor, que devem emprestar sua expertise aos prefeitos que demonstrarem interesse, humildade e sabedoria para construir parcerias sólidas por meio do empoderamento das lideranças da comunidade que legitimamente estejam em busca do bem comum. Gente que esteja determinada a fazer o jogo do ganha/ganha.

 

Parece utopia, mas quem vê o resultado alcançado por Maringá nos últimos anos, recentemente considerada pelo estudo da Macroplan divulgado na revista Exame como a melhor entre as 100 grandes cidades do Brasil, entenderá que o diferencial está exatamente na parceria entre poder público e a sociedade organizada, conscientes de que as boas decisões de hoje vão moldar o sucesso de amanhã.