Silvio Barros | O futuro das nossas cidades

Desafios dependem de decisões da relação sinérgica entre sociedade e poder público. Decisões que devem ser tomadas agora
09/09/2015
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Muito se tem discutido sobre as cidades do futuro. Como serão? Que tipo de mobilidade, de interconectividade e de serviços públicos terão? Algumas das ideias e soluções propostas pelos urbanistas são realmente fantásticas e revolucionárias graças, principalmente, à "Internet das Coisas", que permite agregar inteligência aos serviços e a infraestrutura pública.

Em outras palavras, conectar tudo pela internet: sensores de estacionamento rotativo nas ruas para você saber pelo smartphone onde há vagas disponíveis, controle de semáforos para dar prioridade ao transporte coletivo ou ambulâncias, pegar carona com pessoas que você não conhecia mas que trabalham no mesmo prédio, ser avisado pela geladeira sobre o que está faltando em casa, enfim, isso não tem fim.

O problema é que hoje mais da metade da população global vive em cidades que já existem, muitas delas centenárias, construídas num contexto muito diferente do atual, quando ainda nem havia automóveis e as ruas eram ocupadas apenas por pedestres e cavalos. O grande desafio da sociedade moderna é se preparar para um processo de urbanização mais acelerado adequando as cidades atuais às novas tecnologias e demandas da população olhando para o futuro.

Sabemos que a população das nossas cidades vai aumentar nos próximos 20 anos. Não há dúvida disso. Entretanto, é difícil saber se isso significa crescimento ou inchaço. Se a cidade vai efetivamente se desenvolver e proporcionar aumento na qualidade de vida de seus habitantes – ou se os efeitos de uma expansão desordenada vão tornar a vida insuportável. E isso depende de planejamento de longo prazo.

Crescimento em número de habitantes não significa necessariamente desenvolvimento ou melhores indicadores de qualidade de vida. Muitas cidades, aliás, viveram a versão oposta por falta de planejamento, por não se prepararem para o futuro. O planejamento, no entanto, não pode ser delegado apenas aos políticos, pois, infelizmente, é provável que, por questões ideológicas, prefeitos que venham a suceder a gestão que elaborou um determinado plano discordem de seu conteúdo e, no fim, transformem o que foi produzido em desperdício de tempo e dinheiro.

Por oito anos, fui prefeito de Maringá, no Paraná. A cidade viveu uma experiência interessante em 1996, com a mobilização das principais lideranças empresariais na elaboração do Plano Maringá 2020, constituindo um Conselho de Desenvolvimento Econômico capaz de manter nos trilhos o projeto, atualizá-lo periodicamente e articular durante as campanhas eleitorais mecanismos de comprometimento de todos os candidatos com os objetivos propostos para a cidade. Em 2009, o plano foi atualizado para 2030 e agora já estão elaborando o Plano Maringá 2047, ano em que a cidade comemora seu primeiro centenário. Em 2015, Maringá recebeu o prêmio promovido pela revista Exame e pela consultoria Urban Systems como número 1 em planejamento urbano no Brasil. 

Mas por que as entidades empresariais assumiram esse papel? Porque o planejamento de longo prazo está no DNA das empresas e das organizações, que trabalham com esse elemento e que buscam se tornar maiores, mais fortes, mais influentes e eficientes ao longo do tempo. Avaliar as condições de mercado, fazer análise de competitividade e prever investimentos são elementos naturalmente presentes nas instituições privadas, com ou sem fins de lucro.

A relação entre o governo e o cidadão sofrerá modificações muito mais rápidas daqui para frente – e as megatendências globais acabarão por influenciar ou orientar essas modificações. Um exemplo: se as mudanças climáticas são irreversíveis, resta à humanidade agora adaptar-se às novas condições, o que implica considerar mudanças na infraestrutura urbana para enfrentar enchentes, estiagens, crises energéticas, caos na mobilidade e assim por diante.

O planejamento urbano também será refém de outra megatendência que é a mudança no perfil demográfico. Com taxas de natalidade decrescentes e maior longevidade, equipamentos públicos, como creches, precisarão de adequações: atender idosos, em vez de crianças. Na mesma linha, a malha viária e o plano diretor deverão incorporar números crescentes de vagas para idosos nos edifícios públicos e nos estacionamentos rotativos nas ruas.

Enfim, os desafios para o futuro das nossas cidades dependem de decisões que precisam ser tomadas agora. Decisões que dependerão, em grande parte, de uma relação sinérgica entre a sociedade organizada e o poder público municipal.