A decisão de ter ou não um carro passa pela comparação de custos e benefícios. Do lado dos benefícios, podemos incluir a comodidade: é prático não depender de alternativas de transporte (ônibus, táxi, Uber) que nem sempre estão facilmente disponíveis. Mas os custos não são pequenos: combustível, seguro, IPVA, manutenção etc.
Tudo isso fora o custo de oportunidade do dinheiro aplicado na aquisição do veículo. Como investimento, um carro é um péssimo negócio, pois ele perde valor ao longo do tempo. Se você tivesse colocado o dinheiro em um título do governo, por exemplo, ele teria crescido (ainda mais aqui no Brasil, onde a taxa de juros é alta na comparação internacional). Esse dinheiro que você deixou de ganhar porque decidiu comprar o carro é o custo de oportunidade envolvido.
Esses são custos e benefícios privados. São eles, principalmente, que guiam a decisão dos indivíduos. Ainda que as pessoas não coloquem os números na ponta do lápis, certamente alterações nesses custos e benefícios mexem com suas escolhas. Com uma gasolina mais cara, por exemplo, provavelmente menos gente optará por ter um carro.
Outro exemplo: com a entrada de Uber, 99 e outros, alternativas de transporte passaram a valer a pena, em comparação com a posse de um veículo próprio. Já há indícios de famílias que, diante dessas opções, reduziram o número de carros em casa – leia mais.
Entretanto, os custos do carro não se resumem aos custos privados. Há também custos sociais, que incidem sobre outros indivíduos. São as tais das externalidades negativas. No caso de veículos, temos dois custos sociais bem claros: poluição e trânsito.
Nessa situação, o motorista acaba não pagando totalmente pelas implicações de suas escolhas. Parte dos custos de um carro a mais é compartilhada com outros indivíduos que convivem no mesmo centro urbano – que terão respirar um ar mais poluído e se defrontar com vias mais congestionadas.
Em outras palavras, dirigir um carro é, da perspectiva individual, relativamente “barato”. Assim, o número de carros em circulação, na ausência de intervenção governamental, será excessivo da perspectiva da sociedade.
Isso justifica políticas públicas que limitem o número de veículos, seja via impostos sobre o uso do carro, seja com restrições diretas à circulação.
Em diversas metrópoles da América Latina, há uma política bastante comum: a restrição à circulação de veículos, a depender da placa. Na cidade de São Paulo temos o rodízio municipal, que proíbe que veículos circulem em horários de pico dentro do centro expandido, dependendo do número da placa. Carros com placas terminadas em 1 ou 2 não podem circular nos horários de pico às segundas-feiras; aqueles que terminam em 3 ou 4 estão barrados às terças, e assim por diante.
Esse tipo de política tem claras desvantagens. Primeiro, não se arrecadam recursos (a não ser as eventuais multas). Segundo (e mais importante), as pessoas podem facilmente burlá-la adquirindo outro veículo, com uma placa diferente, que poderia ser usado nos dias em que o outro veículo se encontre bloqueado.
Há evidências desse mecanismo para a cidade do México, que possui uma política semelhante, porém muito mais radical, restringindo a circulação com base na placa quase o dia todo. Pior: o carro adquirido para burlar a restrição tende a ser mais velho e, portanto, a poluir mais. A política, no fim das contas, mostrou-se inócua na redução da poluição do ar na cidade – veja mais aqui eaqui.
O pedágio urbano, muito demonizado por estas bandas, seria na verdade uma política mais eficiente. A cobrança tem o papel de desestimular o tráfego de veículos, da mesma forma que uma restrição como o rodízio. Mas os indivíduos não podem escapar dela comprando outro carro, por exemplo. Além disso, permite a arrecadação de recursos – que poderiam, por exemplo, ser usados para expandir e melhorar o transporte público, aliviando ainda mais as externalidades negativas do trânsito e da poluição.
Texto originalmente publicado no blog do Por Quê? Economês em bom português.