arquitetos associados
Angelo Bucci, 02/10/15
Já era fim de tarde, junto com os arquitetos associados caminhávamos por Inhotim em pleno feriado prolongado, o parque estava apinhado de gente. Então, vem em nossa direção um daqueles carrinhos elétricos, era o extrovertido empresário Bernardo Paz quem conduzia levando pra lá e pra cá os seus convidados de honra. Quando ele reconheceu o grupo de arquitetos freou imediatamente para saudá-los. Naquele momento, na qualidade de amigo do time, fui apresentado ao motorista. Ele logo me disse: recusei projeto gratuito de Norman Foster para pagar pelos trabalhos destes arquitetos!
Este texto começa antes. Ele existe por iniciativa de Fernando Lara, brasileiro de Minas Gerais. Começa distante daqui, pois o Fernando vive em Austin, onde ensina arquitetura na renomada Universidade do Texas. Mesmo longe do Brasil, ele dedica boa parte de seu tempo e de sua pesquisa acadêmica para ampliar nossa compreensão sobre a produção dos arquitetos de sua geração e de seu lugar de origem inserindo-a num plano de diálogo mais amplo. Ele se situa no mundo, decididamente, a partir das suas precedências. Não só ele as mantém sempre à vista como sabe fazê-las se desdobrar em valor e significado. Por essa postura — além de todas as razões que o fazem um arquiteto, professor e autor tão renomado — ele tem a minha admiração. Aceitar, portanto, o seu convite para participar desta publicação é uma honra para mim.
O grupo de arquitetos em questão, razão deste trabalho, merece nota já pelo próprio nome que elegeram para se denominar. Quero destacar a renúncia de um nome próprio, pois arquitetos associados, assim mesmo, em minúsculas, é uma espécie de sufixo que se agrega ao nome de todo escritório nesta atividade. É uma atitude deliberada que condiz com os princípios que o grupo adota em sua prática de modo consistente e que lhe garante um brilho maduro, destaque na obra deste jovem time de arquitetos, todos mineiros, de nascimento ou coração. Denominar-se por um nome comum, genérico, condiz com o engajamento do grupo que divulga expressamente sua opção por diluir a autoria em favor do diálogo, de um arranjo produtivo que favoreça uma dinâmica simples — fácil, fluente e livre — para a composição das equipes empenhadas em cada um dos projetos. Nas palavras do próprio grupo: cada projeto como um trabalho específico para o qual uma organização de trabalho própria é definida. É como se eles aplicassem na própria vida, no seu ambiente de trabalho, os conceitos que defendem para os edifícios que projetam: flexibilidade, mutabilidade e abertura. O nome arquitetos associados, mais que um acerto no batismo, é manifesto, demonstração de clareza sobre os próprios princípios. Tal clareza parece lhes dar uma vantagem a cada jogo — ou projeto — que começam. Além disso, todo arquiteto se reconhece naquele nome, naquilo que o justifica e na atitude que dele se desdobra.
Alexandre Brasil, André Luiz Prado, Bruno Santa Cecília, Carlos Alberto Maciel e Paula Zasnicoff, nascidos todos na década de 1970, formaram-se arquitetos na segunda metade da década de 1990, num período em que a arquitetura brasileira estava dedicada a reconstruir suas bases e seus canais de diálogo, no país e fora dele. Reconstrução necessária para superar o cenário de devastação cultural herdado da destruição e do isolamento que marcaram as décadas de 1970 e 1980 no Brasil. Nesta tarefa de reconstrução, tem grande destaque a restauração das instituições culturais que expõem a produção arquitetônica ao debate e ao diálogo. Refiro-me às escolas, aos concursos, publicações e exposições, incluindo conferências e debates. O grupo demonstra plena consciência das carências deste contexto cultural em que se insere pelo modo decidido como se engaja nessa reconstrução institucional tão necessária à permanência da atividade. Ele toma para si a tarefa, ciente de que é a missão da sua geração. Assim, cada um deles desdobra a sua atuação em diversas frentes paralelas da mesma atividade. Como professores estão também dedicados à pesquisa. Como fundadores, entre outros, da revista MDC, Mínimo Denominador Comum, que, além da publicação, organizam debates trazendo arquitetos de distintas regiões, promovem exposições e têm o cuidado de manter toda produção disponível digitalmente. Nesse ponto se vê amplificar o efeito e o acerto da flexibilidade que é pressuposto do arranjo de trabalho que rege o contrato dos arquitetos associados. Pois aquela mesma abertura, que permite liberdade nos arranjos internos, reverbera também para fora do ambiente do escritório e, assim, abre para cada membro do grupo um campo de atuação próprio, no qual há um espaço legítimo à dimensão do indivíduo, vale dizer, um campo mais autoral que coletivo.
Sim, os arquitetos associados fazem ver com clareza que hoje, enquanto a prática nos escritórios tende a uma ação mais afeita ao grupo, caracterizada pela diluição da autoria, fora dele, sobretudo na atividade acadêmica, a ideia do sujeito vinculado à elaboração do pensamento, dedicado à teoria, à produção de textos e teses restabelece o papel de autor. Essa dupla, ou múltipla, atuação do grupo faz pensar que há dois campos paralelos complementares como espaços afeitos à autoria de um lado e, do outro, à colaboração. Quanto maior o reconhecimento que cada um deles alcança individualmente no campo externo, quase sempre acadêmico, onde cabe o papel do autor, mais o grupo se faz coeso, mais ele se fortalece e mais se imprime àquela equipe uma identidade de arquitetos associados.
Aí está a maior beleza do arranjo que conquistaram. Sim, conquista, pois o fato é um verdadeiro feito, afinal ele pressupõe uma criteriosa elaboração, de difícil gestão e delicada sustentação. O êxito com que eles o fizeram até agora talvez não tenha paralelos em nosso contexto. Por outro lado, o percurso que trilharam abre caminho para seguir os seus passos. Assim, eles ampliam, para todos, o campo de possibilidades de atuação na atividade.
Foto: Gabriel Castro
Aventura, ou uma viagem de automóvel de São Paulo a Belo Horizonte com o propósito de conhecer Inhotim: o parque-museu que, para o que vem ao caso aqui, exibe a maior coleção de projetos dos arquitetos associados. Foi para conhecer aqueles edifícios que cruzei a fronteira entre os dois mundos.
Já era noite, quando me reuni com Alexandre Brasil e Paula Zasnicoff, Carlos Alberto Maciel, Bruno Santa Cecília ali na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte. Faltava apenas o André Luiz Prado, mas, de certa forma, a arquiteta Vanessa Mendes, mulher de Bruno, recompunha o quinteto. Numericamente estava completo. Exatamente ali, o próprio chão que pisávamos era projeto do grupo, pois entre tantas obras emblemáticas que compõem a praça, o Redesenho das Áreas Públicas do seu Entorno, feita em 2008, é obra deste destacado time. Trata-se de um projeto que tem grande valor justamente por ser feito das coisas que pouco se notam. Nem edifício propriamente dito nem praça em si, mas justamente aqueles elementos que não são normalmente foco de atenção: o pavimento do passeio público, a linha da sarjeta, o poste de luz. São pequenos assim os componentes daquele projeto. O feito, por outro lado, é grandioso, pois equivale à conquista de mais espaço para o pedestre e à uma clara mediação entre praça e edifícios. É notável o quanto ali a gente se sente bem tratado onde normalmente não se dá tanta atenção à gente. E os agentes dessa gentileza são justamente aqueles elementos que tendem a passar despercebidos à maioria das pessoas, mas, claro, não àquele grupo de arquitetos. Ao contrário, eles têm olhos cuidadosos para o que não está no foco de todos, eles transportam as bordas ao centro da questão e isso faz muito sentido para os princípios que orientam o modus operandi do grupo: autoria diluída para promover um ideal coletivo. Nada mais eloquente nesse sentido do que o chão de uma cidade, sobre o qual a gente caminha sem quase perceber por onde. Ali este chão quer tanto bem tratar que ele chega a ondular, assim se aproxima das pessoas e se transforma em banco, oferece repouso aos adultos e brincadeiras para as crianças.
E estávamos ali quase por acaso. Ou melhor, era por outra razão. Afinal, justo em frente está o edifício Oscar Niemeyer [1954-1955], onde vivem Bruno e Vanessa. Subimos para conhecer o apartamento deles e a cobertura que é uma área comum. Foi uma calorosa acolhida, cada um dos arquitetos tinha uma boa história para contar sobre aquele prédio, algum detalhe a destacar no edifício, eram descrições cheias de admiração sobre os acertos do desenho de Niemeyer. Dali, seguimos para o edifício Tinguá [1968-1970], de Éolo Maia, onde moram Alexandre e Paula. Um edifício e outro são sintomáticos dos valores que orientam o grupo, são demonstrações emblemáticas do respeito e do apreço que têm pelas gerações, distintas, precedentes. Eles consideram, estudam e elaboram essas precedências para prosseguir como quem sabe que é preciso constituir uma plataforma da qual se possa partir.
Foto: Marcelo Coelho
A relação entre arquitetura e arte é um traço fundante do moderno no Brasil. Sobram evidências disso. O painel em ladrilhos hidráulico de Athos Bulcão no Edifício Niemeyer na Praça da Liberdade em Belo Horizonte é um delicado exemplo. Noutra escala, Brasília ilustra essa parceria entre arquitetura e arte, de um modo bastante eloquente. No contexto moderno brasileiro a aproximação entre as duas atividades, arte e arquitetura, é deliberada e profícua. As paisagens de Burle Marx ocupam o centro dessa relação, ou melhor, elas condensam os dois campos de ação, arquitetura e arte, numa única atividade.
É possível dizer que, a seu tempo, a arquitetura moderna brasileira soube convocar os artistas. Nessa associação havia diálogo. Digo, interlocutores de igual importância que construíam, juntos, um ideário compartilhado, um vocabulário propositivo comum e uma identidade cultural que, desde o início, já surgia profundamente sedimentada e fecunda no imaginário nacional.
Às vezes eram os artistas, ou a crítica de arte — duas formas de ação de um mesmo engajamento —, que refletiam sobre o estatuto da arquitetura. Exemplo notável disso foi o Congresso Internacional de Críticos de Arte capitaneado por Mário Pedrosa e realizado em Brasília, em 1959, um ano antes da inauguração da cidade. O evento fez reverberar fortemente na imprensa especializada mais influente no plano internacional o fato e o sentido da construção da nova capital.
Com efeito, essa identidade cultural, que marca a arquitetura moderna no Brasil, ecoaria também na crítica e nas obras realizadas fora do país desde a década de 1940. A exposição Brazil Builds, realizada no MoMA em 1943, o demonstra bem. Os painéis de Portinari, cujo restauro foi inaugurado neste ano de 2015, na sede da ONU em Nova Iorque, conforme projeto de Oscar Niemeyer e Le Corbusier desenvolvido por Wallace Harrison, é emblemática demonstração da associação entre arte e arquitetura em obras realizadas fora do País.
Em Inhotim, a mesma associação ocorreu pela via inversa. Foi a arte contemporânea que fez, de certa maneira, a convocatória à arquitetura. Eram elas, as obras de arte, que ali demandavam pavilhões dedicados às vezes a um único artista ou até a uma só obra.
Foi assim, como se fosse pelo desdobramento necessário da preexistência de uma grande coleção ainda sem casa, que entraram em cena os arquitetos associados. Eles, em paralelo com outras pouquíssimas equipes, atuam num cenário já precedido, em boa medida, por obras de arte —uma espécie de residente dos novos edifícios — e, claro, precedidos também pela geografia, pelo parque e pelos exuberantes jardins.
Inhotim era para eles a cidade: o campo de ação, a precedência, a razão e a paisagem. Enfim, era alvo para aquelas obras de arquitetura e era também meio. Inhotim solicitava e realizava, detinha os recursos e os meios como uma espécie de fábrica para a construção daquelas obras, contando inclusive com mão de obra própria. Claro, para os arquitetos isso corresponde ao campo e aos meios para a ação. O limite do que se pode fazer está relacionado também a quanto se conhece e se maneja esses meios. Nesse sentido, dentro daquele mesmo campo a sequência de obras de um mesmo grupo de arquitetos segue uma relação de série, de encadeamento, uma informa e habilita a proposição da outra. No caso do trabalho dos arquitetos associados, que veremos aqui através de três belos exemplos, esse limite é tomado como fronteira a ser expandida.
[1] A Galeria Miguel Rio Branco [2008-2010] se alcança numa aproximação arquitetônica de boa carga dramática. O caminho que leva à entrada do edifício atravessa por sob o balanço do prisma feito em estrutura metálica e fechado com chapas de aço já quase totalmente recobertas pela pátina avermelhada típica. É um prisma irregular, mas de belos números: 40x30x25x15m em planta. O volume de dupla altura é uma câmara escura que serve à exibição de fotografias e vídeos de Miguel Rio Branco e que se vê sempre solta do chão, é ela que faz o principal espaço expositivo. Visitar o espaço em plena atividade e praticamente escuro — uma vez que se trata de exposições de vídeos e fotos com luz específica e recortada —, é conhecer e perceber o edifício como se fosse de olhos fechados. Uma maravilha, pois é uma forma de apreensão que faz falta à essa atividade tão dominada pelo sentido da visão.
O prisma escuro descansa em seu oposto; numa câmara clara, aberta com vidros nas quatro faces verticais e aberto também no piso, na face horizontal, como um buraco no chão. É num cubo de luz e sem chão, que o grande prisma de aço parece se apoiar. Este perímetro inferior transparente — originalmente transparente, depois por exigência do artista acabou coberto por uma película translúcida. Talvez tenha perdido parte das relações visuais que se queria ali, mas mantém ainda a mesma relação de peso e leveza com o prisma superior —, enfim, aquele perímetro em vidro encima com uma coroa de luz o ambiente escavado também de dupla altura. Uma câmara clara para exposição de fotografias.
É justamente esse pequeno cubo enterrado que estabelece o vínculo, formal e compositivo, mais estreito com a galeria seguinte.
[2] Galeria Cosmococas [2008/2010], cinco cubos devidamente arranjados para abrigar cinco das exposições da série feita por Hélio Oiticica e Neville d’Almeida. Os cinco prismas estão envolvidos por uma parede contínua, sem nenhuma abertura exceto as portas de acesso, e revestida em pedras. As paredes afloram na face leste do edifício e mergulham na topografia na sua face oeste. A laje de cobertura faz um terraço jardim de modo que parece não haver edifício, o que se vê parecer ser uma parede de contenção, um maciço, contraforte. Se não fossem as portas e o convite evidente que elas fazem não se perceberia a existência de um edifício semienterrado ali. Caverna de cinco câmaras secretas, uma delas inundada, para as cosmococas.
As duas obras — Miguel Rio Branco e Cosmococas — foram desenhadas e construídas simultaneamente, ambas desenhadas pelos cinco integrantes dos arquitetos associados.
Seria oportuno pedir licença a Helio Oiticica e Neville d’Almeida para dedicar um dia da galeria deles a uma exposição do grupo de arquitetos. Cada um dos cinco teria para si o espaço de um cubo onde se mostraria a obra autoral de cada um — digo os textos, as teses —, assim, dentro de cada um daqueles cinco espaços a gente os visitaria com seus nomes próprios. A obra deles como grupo estaria exposta no hall central, é ali naquele hall que a autoria se dissolve para construir uma proposição coletiva. Ali a gente visitaria a produção de arquitetura do grupo, os arquitetos associados escrito assim sem maiúsculas. É verdade e todo mundo sabe, a gente acaba por construir com pedras o que afinal somos. Mas neste caso isso está feito com uma nitidez rara de se ver. É exemplar.
As duas obras guardam relações entre si, tanto que embora estejam suficientemente distantes para que de uma não se veja a outra, ainda assim, a gente as vê juntas, indisssociáveis. Elas são feitas de materiais diferentes e têm arranjos distintos. Na Miguel Rio Branco o prisma de aço é extrovertido. A câmara clara, porém, já tem a mesma instrospecção que marca todos os ambientes da Cosmococas. Contudo, as duas galerias foram feitas ao mesmo tempo. Por isso, embora elas ampliem o campo de experiência — e, vale dizer, o grupo soube ressaltar o valor dessa ampliação quando exploraram técnicas construtivas distintas numa e noutra —, sendo concomitantes a experiência de uma não poderia informar a proposição da outra. Não é esse o caso do trabalho mais recente, a galeria Cláudia Andujar.
[3] Galeria Cláudia Andujar [2012 / 2015]
Visitar uma obra em construção naquele estágio em que a visitamos ainda em maio de 2015, quando todos os espaços já estavam definidos e faltavam apenas caixilhos, pisos internos, instalações e revestimento internos das paredes em alvenaria já seria covardia: pois um arquiteto sempre gosta. Mas, naquele caso, a covardia era ainda maior, pois tinha o efeito surpresa e um sentido de conquista. Afinal era feriado prolongado, a obra naturalmente estava fechada num parque enorme em pleno funcionamento e cheio de visitantes. Não seria possível normalmente ir até o canteiro de obras. Acompanhado pelos autores saímos da Galeria Miguel Rio Branco por uma trilha escondida, chegamos a uma estrada vazia e logo, depois de caminhar talvez algumas dezenas de metros, os painéis verticais feitos em tijolo aparente começaram a surgir. Em minutos estávamos lá, em frente à galeria de acessos, eu já arrebatado ainda antes mesmo de entrar.
Aqui o caso é outro, porque no momento em que os arquitetos começaram a pensar nesta obra eles já haviam acumulado uma larga experiência em Inhotim, uma vivência de trabalhos que ultrapassa em muito aquelas duas galerias descritas anteriormente. Pois soma outros edifícios importantes, como o Centro Educativo Burle Marx. Além e antes disso, há a atividade da Paula Zasnicoff em diversas outras obras ainda antes mesmo do grupo, e também projetos ainda não realizados como é o caso do edifício Grande Galeria e Restaurante. Quero dizer, aqui o tempo e o acúmulo de experiências anteriores dentro do contexto específico em que se produz as obras em Inhotim informavam muito bem a proposição arquitetônica para a Galeria Cláudia Andujar. Nesse sentido, esta obra é mais madura. As opções que decorrem desse arsenal propositivo amadurecido são num certo sentido mais simples, como paredes em alvenaria de tijolos aparentes. Mas são extremamente elaboradas, como demonstram os cinco diagramas para os painéis de alvenaria que compõem com grande riqueza as fachadas externas. A impressão é que é tudo mais simples e, ao mesmo tempo, menos previsível; tudo mais econômico e, por outro lado, ainda mais elaborado.
Mesmo com o prédio inacabado, a arquitetura que se vê permite inferir que houve um diálogo rico entre o artista, ou com o projeto expositivo para aquela galeria, e os arquitetos. Como se o programa dialogasse muito bem com a arquitetura mesmo inacabada. Desde já, o resultado impressiona muito bem.
Vale notar, a experiência e a maturidade, em arquitetura, também têm as suas armadilhas. Quero dizer, elas nem sempre levam a uma obra de melhor qualidade. Não raro elas fazem aflorar mais frustrações que realizações e podem impregnar as obras maduras com traumas ou inundar a atividade experiente de vícios. Quando isso acontece, é como se as obras exprimissem o cansaço, o esquematismo. Com isso, é fato, o mundo vai se construindo com pura falta de tempo e disposição. É porque essas armadilhas parecem se tornar cada vez mais frequentes que ganha ainda mais valor o trabalho dos arquitetos associados, pois eles demonstram saber se relacionar com suas precedências de modo saudável e positivo. Neles, que parecem já ter nascido maduros, o tempo e a experiência prévia fazem prevalecer um critério cada vez mais acurado, com o tempo eles ganham brilho e ainda maior confiança. É por isso que eles podem prescindir de recursos e artifícios triviais em favor de um foco preciso e de uma elaboração cuidadosa do que realmente interessa. É verdade, terminei minha aventura em Minas do melhor modo possível, nessa obra em alvenaria ainda em construção e, desde já, maravilhosa.
Justamente aqui, nesse ponto, é que se encontra a melhor das surpresas: eles que renunciaram às veleidades, às personalidades e ao próprio nome para deliberadamente diluir a autoria em favor do grupo, afinal mostram-se capazes de construir uma obra de grande vigor, personalidade e, devo dizer, nitidamente autoral. É assim que arquitetos associados se torna um nome próprio.
Não tenho dúvidas, pelo menos naquilo que toca à parcela que cabe ao grupo, o mundo não será construído às pressas.
Você dirá, e estou de acordo, a conclusão era óbvia, naquelas terras há muito se destila uma sabedoria vagarosa. Sim, afinal eles são mineiros.
Volto à declaração que ouvi do dono das minas, de que ele recusara a generosidade do ilustre arquiteto inglês preferindo pagar pelo talento dos arquitetos associados. Não foi por acaso que ele foi sempre tão exitoso em suas empresas. Um tipo assim, mesmo quando diz estar perdendo faz, como se diz por lá, um negocião!
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Texto publicado originalmente como prefácio ao livro arquitetos associados, gentilmente cedido pela Editora Miguilim.
Todas as fotografias de Leonardo Finotti, exceto onde indicado.