Entrevista | Victor Carvalho Pinto

Consultor Legislativo do Senado Federal na área de Desenvolvimento Urbano
03/04/2017
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Victor Carvalho Pinto especialista em Direito Urbanístico, consultor legislativo do Senado Federal na área de desenvolvimento urbano e fundador do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico. É Doutor em Direito Econômico e Financeiro pela Universidade de São Paulo, autor do livro "Direito Urbanístico: Plano Diretor e Direito de Propriedade". Victor é um dos debatedores convidados para o lançamento do “Guia de Gestão Urbana”, de Anthony Ling, publicado pela BEI Editora.

 

 

O lançamento ocorrerá às 19h do dia 04/04/2017, no Itaú Cultural, e contará com a presença de Anthony Ling, Victor Carvalho Pinto e Rodrigo Agostinho (ex-prefeito de Bauru e gerente executivo do Programa de Cidades e Territórios do Instituto Arapyaú), e será mediado por Raul Juste Lores, jornalista da Folha de São Paulo. 

 

 

Como você avalia o estágio atual de legislação urbanística no país? É preciso produzir mais emendas, leis e normas, ou devemos nos concentrar em implementar as que já existem?

 

Apesar do grande avanço representado pela edição do Estatuto da Cidade, em 2001, e do Estatuto da Metrópole, em 2015, a legislação urbanística brasileira ainda é fragmentada e assistemática em comparação com países que contam com um Código de Urbanismo. Entre suas principais deficiências, destaca-se a não tipificação dos planos urbanísticos e a inexistência de uma técnica de reparcelamento do solo urbano.

 

 

A tipificação é a estrutura básica de um sistema de planejamento urbano e consiste na padronização do conteúdo e da forma de apresentação de cada plano urbanístico. É necessário definir quais são os planos a serem elaborados e normalizar sua escala e linguagem, a fim de que se adote uma única convenção gráfica em todo o país.

 

 

Na ausência dessa padronização, não se tem claro quais são os estudos prévios, os órgãos a serem consultados, os profissionais responsáveis e o grau de detalhamento a ser adotado na aplicação de cada instrumento de política urbana. Sem tipificação, não há como fazer valer o princípio da reserva de plano, que condiciona a aplicação de cada instrumento à sua incorporação no respectivo plano. Resulta desse quadro que obras e alterações de uso do solo podem ser realizadas à margem dos planos existentes, por meio de decisões políticas desvinculadas de estudos técnicos e consulta à população, seja pelo Poder Executivo, seja pelas Câmaras Municipais.

 

 

Uma técnica de reparcelamento é necessária, por sua vez, para viabilizar a reurbanização de áreas degradadas, subaproveitadas ou sujeitas à implantação de infraestruturas de grande porte. O reparcelamento visa substituir aqueles logradouros e lotes existentes por outros, adequados aos novos usos que se pretende promover. Sem reparcelamento, as alterações no zoneamento são ineficazes, pois os incorporadores não conseguem adquirir imóveis contíguos para promover o remembramento dos lotes necessários para construir edifícios de maior densidade.

 

 

Em muitos países, procura-se estimular os proprietários de imóveis antigos a permutá-los por imóveis futuros, de valor igual ou superior, ou a se associarem a uma entidade constituída especificamente para promover a reurbanização de uma região, que se financiará pela revenda dos imóveis produzidos no mercado. Essa técnica é muito empregada internacionalmente também para financiar infraestruturas de transporte, como estações de metrô. Como não dispomos de um sistema desse tipo, nosso único instrumento é a desapropriação, que é repudiada porque prejudica os proprietários. Não apenas deixamos de reurbanizar o entorno dessas infraestruturas como, muitas vezes, prejudicamos os moradores vizinhos, que com frequência sujeitam-se a impactos adversos.